domingo, 22 de abril de 2012

INSPETORA DA POLÍCIA CIVIL DO RGS ESCREVE AO GOVERNADOR DO ESTADO






Assim como já publiquei aqui neste espaço uma carta do Comissário de Polícia Uirassu, que tem muitos anos de Polícia Civil, tomei a liberdade de publicar, agora, uma carta, também a carta de uma Inspetora nova na função policial, mas que não diferente da anterior, sabe das dificuldades dessa instituição!

Por Sílvia Furtado, Inspetora de Polícia:

Sábado, 21 de abril de 2012
Mensagem ao Governador Tarso Genro.

Excelentíssimo Senhor Governador do Estado,

Sem me ater aos aspectos formais da redação oficial e fazendo uso da Internet, meio mais democrático atualmente existente, gostaria que, gentilmente, me concedesse um breve tempo de sua atenção. Sou Inspetora de Polícia há menos de dois anos, porém tenho uma longa história de vida. Convivo com colegas de todas a faixas etárias, mas, principalmente, com jovens recém ingressados na Polícia Civil. Emociono-me, diariamente, com o entusiasmo dos jovens policiais no desempenho de suas atividades, que me contagia e faz ignorar o peso do tempo ao meu cotidiano. A muitos vejo como filhos e trato com carinho maternal. São os meus guerreiros, Senhor Governador, e os amo, cuido e me importo, como deveria fazê-lo a Instituição Polícia Civil.
Assim, não há como ficar alheia aos aspectos que, fatalmente, far-me-ão ter que assistir, gradativamente, meus guerreiros irem embora, um a um, em busca de outras oportunidades de trabalho, em que sejam remunerados de forma que lhes permita ter uma vida digna. Muitos, atualmente, encontram-se longe de suas casas, pois estão lotados onde há falta de efetivo. Quanto a isso, nada haveria para ponderar, não fosse o fato de estarem vivendo em condições precárias, em virtude do baixo vencimento recebido. Sequer podem trazer seus cônjuges e filhos para perto de si, pois suas mulheres ou maridos não podem abandonar seus empregos, os quais complementam a garantia de sobrevivência da família. As famílias, dessa forma, permanecem divididas, na esperança de dias melhores; e os jovens policiais vivem o dilema de buscar novo trabalho, abandonando aquele que conquistou por esforço e vocação, ou de estar separado de seus amores, sem sequer acompanhar o crescimento dos próprios filhos.
É, Senhor Governador, policiais são pessoas! Trabalham sob risco permanente, com uma missão que não leva em conta seus problemas familiares, mas, mesmo aos olhos mais cegos, eles existem. Independentemente da sobrecarga pessoal, seguem sua vocação e desempenham suas funções de uma forma que orgulharia até o mais indiferente cidadão. Durante as aulas que ministro na ACADEPOL, no curso de formação de Escrivães e Inspetores, vez ou outra algum aluno pergunta: “Professora, a senhora acha que irá melhorar a situação, será que o Governador fará uma boa proposta?” Digo sempre que todos temos fé. Não quero que percam aquele brilho no olhar, que é reflexo do entusiasmo que os move, e indica aos que os dão a instrução, que estão diante de pessoas vocacionadas e motivadas para se tornarem excelentes policiais.
E o senhor, Governador, crê que eu poderia ficar calada, convivendo, tão proximamente, com tal realidade? Jamais, pois como cidadã estaria sendo indiferente, e como policial, colega e instrutora, estaria, no mínimo, sendo negligente com meu trabalho, ao ignorar os fatos que prejudicam tanto a motivação dos futuros policiais, quanto a permanência dos que já fazem parte da Polícia Civil. Quanto aos colegas que há mais tempo fazem parte da Instituição, não tecerei maiores comentários, pois diante deles me curvo e os reverencio pela coragem, persistência e amor pelo trabalho que desenvolveram até aqui, permanecendo nessa função, não obstante o descaso dos sucessivos governos, fato que os abateu, mas não os deitou por terra. Estes também são guerreiros, que criaram seus filhos oferecendo muito pouco de seus tempos, além de vê-los pouco assistidos materialmente.
Como ficar calada diante desta realidade que me sufoca e aflige? Esperança é apenas uma palavra, não paga despesas, que são impiedosamente cobradas. É incrível como as alternativas para o controle severo dos cidadãos nasce mais aprimorada a cada dia, possibilitando ao Estado cobrar e cobrar, até pelo que não oferece. Em contrapartida, o que é prometido em campanha eleitoral parece ser fadado à impossibilidade ou inviabilidade de execução, tornando os Servidores do Estado, cidadãos de segunda categoria, pedintes incômodos daquilo que lhes é um direito.
Senhor Governador, dignidade humana passa por todos os aspectos que apontei no meu relato e é um direito constitucional, o senhor bem sabe. Peço-lhe, encarecidamente, que transforme a palavra esperança em sinônimo de resultado positivo, para que não tenhamos o dissabor de ver nossos jovens policiais migrarem para outros segmentos, ou para que não sejamos obrigados a ver no olhar daqueles que permanecerem, a perda gradativa do brilho do entusiasmo, que atualmente os caracteriza. Quanto a mim, por favor não julgue minhas palavras como de cunho interesseiro, pois sou uma policial com 59 anos de idade e, portanto, pouco tempo permanecerei ao lado de meus colegas em razão da relação legislação e idade. Enquanto permanecer, ambiciono ter a felicidade de vê-los bem, valorizados, realizando suas aspirações profissionais como dignos integrantes da Polícia Civil do Estado do Rio Grande do Sul.

Respeitosamente,

Silvia Furtado
Inspetora de Dpi Polícia Civil

Nenhum comentário:

Postar um comentário